domingo, 25 de outubro de 2009

GLOBALIZAÇÃO E PARTICIPAÇÃO POLÍTICA

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"GLOBALIZAÇÃO E PARTICIPAÇÃO POLÍTICA"
Valmir Lima de Almeida



A participação política dos indivíduos na sociedade global apresenta-se como um caminho, uma das principais vias alternativas, para o alcance da inserção social e da diminuição das desigualdades económicas reveladas pela globalização.

O processo de globalização em marcha acabou com os limites geográficos, mas não eliminou a fome, a miséria e os problemas políticos de milhões de globalizados que vivem (ou sobrevivem) abaixo da chamada linha da pobreza absoluta.

Afastados dos centros das decisões pelos princípios excludentes do neoliberalismo, os indivíduos, limitados na própria capacidade de compreensão dos conceitos neoliberais, não encontram pontos de referência para tornarem-se agentes de influência política no processo global.

(...)

A globalização é o cenário do desenvolvimento desigual. Ela é problemática e contraditória, dissolve espaços e tempos e impõe ao indivíduo padrões e valores desconhecidos.

Estas afirmações de Octavio Ianni (1995), dão a dimensão da aldeia global que vive o indivíduo no início deste novo século. Ao mesmo tempo em que perde raízes, se vê envolvo em uma imensa multidão de solitários, satelitizada, electrónica e desterritorializada. As mesmas condições que alimentam a interdependência e a integração, sustentam as desigualdades e contradições em âmbito global.

"A mesma fábrica da sociedade global, que se insere e que ajuda a criar e recriar continuamente, torna-se o cenário que desaparece".

É a expansão avassaladora das relações, processos e estruturas de dominação em escala global, que em qualquer lugar e a todo instante provocam uma apropriação e desapropriação de conceitos, que transbordam fronteiras e levam ao declínio a sociedade tradicional.

É uma sucessiva incorporação de novos mundos, onde "(...) as organizações políticas, económicas e culturais, prevalecem sobre os indivíduos, classes, grupos, partidos, Estados nacionais. Elas conseguem aliar-se com grupos locais, integram-se a sectores sociais, partidos ou governos, mas organizam-se segundo razões próprias, de ordem global.". Dessa forma, prevalecem sobre os indivíduos, que passam a viver a crise da razão.

O carácter particularista das estruturas económicas, aliado ao desconcerto social e cultural, tem colocado ao indivíduo as mais diversas formas de antagonismos, que dificultam-lhe a tomada de decisões e o inibe de participação política.

Uma análise da participação política dos indivíduos na sociedade globalizada, mostra que as dificuldades impostas pela globalização, para a conquista de autonomia, forjam-se na própria globalização, porém são alimentadas e tornam-se grandes barreiras, no despreparo, intelectual ou político, dos próprios indivíduos em tomar para si as rédeas do mundo global.

Ao indivíduo cabe perceber que as dificuldades de participação política na sociedade global não se resumem às questões ideológicas e económicas do neoliberalismo. Elas também se revelam em acções do quotidiano, como o comportamento consumista na compra de algum produto ou no processo de aculturação, de massificação de valores que sofre dos meios de comunicação.

Enfrentar e superar essas dificuldades, exige do indivíduo autonomia, a construção de uma identidade pessoal, capaz de delimitar espaços e gerar novas consciências de cidadania.

O alienante predomínio das coisas sobre os homens, tem criado enormes barreiras para a tomada de consciência dos indivíduos, o que dificulta ainda mais a superação das dificuldades de participação política e a consequente inserção na sociedade globalizada. O indivíduo não consegue ter domínio de um aparato mecanizado, que cria constantes necessidades, tenciona as relações sociais e dita as normas no mundo globalizado.

Somos escravos do nosso aperfeiçoamento técnico, "(...) modificamos tão radicalmente nosso meio ambiente que devemos agora modificar-nos a nós mesmos, para poder viver nesse novo ambiente."

O indivíduo tem extremas dificuldades de situar-se em uma sociedade, que assim como assinala o declínio do Estado-nação, faz emergir novos e megacentros mundiais de poder, soberania e hegemonia. A situação é tão problemática e contraditória que ele já não consegue identificar os donos do poder. Fica deslocado ainda mais do centro das decisões políticas, diante da doutrina neoliberal que transfere as possibilidades de soberania para as organizações, corporações e outras entidades de âmbito global.

As elites buscam criar condições que nunca se resolvem, acenam para os indivíduos, constantemente, com novas perspectivas, aliam-se a sectores sociais, partidos ou governos, mas definem as decisões segundo as suas razões e interesses políticos. Como destaca Octavio Ianni (1995, p. 79): "o povo, as massas, os grupos e classes sociais são induzidos a realizar as directrizes estabelecidas pelas elites modernizantes e deliberantes."

Ao indivíduo aparece uma globalização de padrões de consumo, de métodos e estilos que se neutralizam de formas diferentes na vida de cada um. A mesma diversificação de valores que lhe é apresentada, retira-lhe a capacidade da escolha autónoma e reduz-lhe a possibilidade de participação política.

Há de se considerar também a universalização dos meios de comunicação, que levou à aldeia global informatizada. Tudo que se globaliza, virtualiza-se. As próprias idéias transfiguram-se na magia da electrónica. Robotizado, o indivíduo não encontra o ponto de referência da reflexividade política.

"O partido, a opinião pública, o exercício do voto, a governabilidade, a estabilidade ou a instabilidade de regimes políticos, a magnitude ou a irrelevância dos factos sociais, económicos, políticos e culturais, tudo isso passa a depender, em alguma escala, da forma pela qual os Media descrevem e interpretam".

O problema maior do indivíduo é encontrar a essencialidade da verdade dos factos, parâmetros de compreensão entre o que informa e o que aliena na globalização. São questões essencialmente ideológicas, normalmente manipuladas pelos meios de comunicação de massa, e que expressam uma nova concepção acerca da transformação social e da prática política, imposta pelo neoliberalismo.

Ao indivíduo é necessário compreender que a globalização é um processo em marcha, inacabado, que modifica as suas condições de autonomia, porém não o impede de reflectir, pensar e agir. As dificuldades que enfrenta de participação política estão em encontrar-se na imensidão interactiva de conceitos, valores, idéias, que alargam ou reduzem horizontes, diante da maior ou menor capacidade de discernimento das forças que actuam no desenvolvimento da globalização, a qual, "(...) modifica substancialmente as condições de vida e trabalho, os modos de ser, pensar e imaginar. Modifica as condições de alienação e as possibilidades de emancipação dos indivíduos."

A globalização criou as condições de uma nova e moderna visão do mundo, porém não conseguiu evitar de ser, igualmente, uma fonte reveladora das imensas desigualdades sociais, das diversidades locais, nacionais e regionais, que assim como interagem, chocam-se nos limites e deslimites da aldeia global.

O desafio do indivíduo de vencer suas dificuldades de participação política está em grande medida, na capacidade do mesmo em compreender que a política deve ser uma actividade lúcida, que necessita de homens lúcidos, capazes de lutar por uma sociedade autónoma, que forme necessariamente indivíduos autónomos.

Cornellius Castoriadis (1992), considera que o grande desafio posto para os indivíduos na globalização é o de ascender a autonomia, ao mesmo tempo que absorve e interioriza as instituições existentes.

Uma política de autonomia, como recomenda Castoriadis, deve por sua vez, agir sobre os indivíduos, com o objectivo, de que possa ajuda-los a atingir a sua própria autonomia. Um projecto de autonomia é, pois, a transformação do sujeito de maneira que ele possa ser participante do processo, ou seja, tenha participação política na sociedade em que vive.

A participação política, portanto, é exigência básica para que o indivíduo supere as barreiras impostas pela globalização e consiga desenvolver acções de cidadania dentro da própria sociedade global. Nesse sentido, é necessário encurtar o distanciamento entre as formas institucionais existentes, sejam jurídicas ou políticas, e a real possibilidade de reconhecer nas leis, nas instituições, as suas próprias leis e o seu próprio poder.

A cidadania, compreendida como soberania, implica, necessariamente, em indivíduos que tenham alcançado um grau de autonomia, de participação política, de auto consciência. Nesta altura da globalização as possibilidades de auto consciência ainda são reduzidas, limitadas. O que predomina são incertezas, individuais ou colectivas, geradas pelo próprio processo de desterritorialização.

Em a "Sociedade Global", IANNI (1993, p.123), afirma que "o indivíduo somente pode realizar-se na sociedade. Está sempre na dependência de suas relações com os outros, mesmo que se iluda em sua auto-suficiência". Esta compreensão leva-nos a acreditar que as dificuldades que enfrenta o indivíduo para construir um projecto de autonomia está na razão das desigualdades e contradições sociais em âmbito global.

"A globalização exige também desterritorialização de decisões. O tomador de decisões terá que acostumar-se à falta de tempo para reflectir, já que uma pergunta dá a volta ao mundo em segundos."

Há uma constante reproblematização da própria sociedade global. As nações integram-se e desintegram-se na velocidade da luz. As transformações sociais são tão intensas, que assim como revolucionam pela informatização, fazem ressurgir factos que pareciam esquecidos, anacrónicos. Os horizontes abertos pela globalização iluminam o presente e recriam o passado.

Os indivíduos estão acoplados a uma Media impressa e electrónica, que transforma o mundo em paraíso das imagens, criam linguagens e formas de expressar que dissolvem as barreiras herdadas do territorialismo. Tudo se desterritorializa. O mundo transforma-se em território de todo mundo, "(...) se torna grande e pequeno, homogéneo e plural, articulado e multiplicado. Mesmo os centros decisórios mais fortes, nem sempre se afirmam absolutos, inquestionáveis. Globalizam-se perspectivas, dilemas sociais, políticos económicos e culturais. Os problemas nacionais mesclam-se com as realidades e os problemas mundiais."

É necessário, porém, que o indivíduo veja o mundo como um conjunto de nações e regiões formando um sistema global, integrado a uma rede de interdependências, que está a exigir-lhe a todo instante tomada de decisões. O posicionar-se exige-lhe a superação da crise da razão, isto é, o rompimento dos limites impostos pela tradição.

É importante que o indivíduo supere as práticas políticas instituídas no passado, para alcançar a participação política na globalização. A submissão, o conformismo e a alienação não lhe conduz ao caminho da autonomia, via principal para o alcance da reflexividade social, do conhecimento actualizado, da tomada de decisão e, por conseguinte, da própria participação política.

A autonomia é requisito básico para a participação política do indivíduo na globalização. Somente um indivíduo autónomo é capaz de processar e seleccionar informações, ter domínio de conhecimento, tomar decisões e posicionar-se frente a um mundo de riscos, incertezas e conflitos globais.

A autonomia leva o indivíduo à participação política, porém, não devem estar atreladas as justificações de ordem económica ou ideológica que o incapacitem ou impeçam a condição de ser, agir e entender as contradições que permeiam o mundo globalizado.

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COMENTÁRIO:

A participação política no fenómeno globalizante será, neste tempo, o maior paradigma da sociedade moderna e do “mundo político”.

Políticos e agentes económicos e sociais não se entendem quanto à matriz de uma Nova Ordem produzida pelo Mundo Global.

Se na Ordem Económica e Social predominam dúvidas e questões encobertas relativas a novas práticas e condutas de vida dos mercados, dos grupos sociais e das comunidades políticas, económicas e sociais, na Ordem Política predomina o caos do pensamento e da “atitude da razão” na conduta da condução do Negócio do Estado (em todos os padrões da sua atitude política e a todos os níveis do Poder Político transversal).

As consequências políticas, económicas e sociais são imprevisíveis e incontroláveis, e de uma dimensão (assustadora) muito superior ao fenómeno que lhe deu origem – a Globalização (naturalmente).

No fundo, todos temos medo de “Algo” que desconhecemos (em grau diferente) porque alguém que não gosta ou não concorda com a sua dinâmica política (da Globalização) se empenha em grandes campanhas mediáticas que lhe permitem atingir um padrão ambicionado para a Conduta Política dos Povos e dos Estados.
(ou por palavras diferentes, concretiza-se numa nova Forma de Poder no Estado)

No entanto, a dinâmica política e económica mundial, e a estratégia, consagraram a Globalização como fenómeno político inseparável do crescimento económico dos Estados e dos Povos, e incontornável; e o Liberalismo Social como Meio de Controlo e Prática Política da sua conduta de aplicação, e como ferramenta política para pôr Ordem no próprio Sistema Internacional daí emergente.

A Globalização é, pois, um fenómeno político mundial, global e um facto consumado para todos os povos do mundo.

“Conhecê-lo” é, pois, é um objectivo crítico.

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domingo, 18 de outubro de 2009

EDUCAÇÃO, CULTURA E GLOBALIZAÇÃO III

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A
Educação no Contexto da Globalização
Prof. Elian Alabi Lucci(autor de livros didáticos)


A globalização económica é um processo que ocorre em ondas, com avanços e retrocessos separados por intervalos que podem durar séculos.

Para um certo número de estudiosos, a primeira onda globalizante se deu por ocasião da ascensão do Império Romano. Enquanto os gregos se dedicavam à filosofia em suas cidades-estado e ilhas, os romanos articulavam seu sistema legal, difundiam o uso da moeda e protegiam o comércio contra as investidas dos piratas. Com a queda do Império Romano, acabou ocorrendo uma feudalização política e comercial, pondo fim ao primeiro movimento de globalização.

A segunda globalização se deu nos séculos XIV e XV, com o ingresso do mundo ocidental na era dos grandes descobrimentos marítimos. Mas o grande surto do comércio internacional, com a abertura comercial para o Oriente, foi frequentemente interrompido por guerras religiosas e dinásticas das monarquias europeias. Foi nesse período que, pela primeira vez, se falou verdadeiramente em globalização da economia. Segundo Schumpeter (History of Economic Analysis, 1954, p. 85), isso coube ao Arcebispo de Florença, S. Antonino (1439), que na sua Suma Teológica, em que tratava de ética e economia, propôs uma economia moderna concebida globalmente e cujo objectivo mais importante era, sem dúvida, promover a justiça social. No tocante à propriedade, Antonino diz que o destino universal dos bens é um direito natural e, portanto, inalienável a que todos temos direito.

"Schumpeter ha escrito sobre Antonino de Florencia que ‘probablemente se trate del primer autor que debamos una aproximación global a la economia en sus distintos aspectos esenciales’. Es este, sin duda, un gran homenaje para un dominico que se convertiría en arzobispo de Florencia y escribiria una Suma Teológica de la que ha podido un auténtico tratado de economia de factura asombrosamente moderna." LAUBIER, Patrick de. Hacia la civilizacion del amor. Madrid, Rialp, 1993, p.71

A própria economia social de mercado, defendida pela China hoje, teve origem, segundo Schumpeter e outros economistas e cientistas sociais, nas tentativas de Antonino de promover regulações de carácter ético, quanto aos preços em economia.

A terceira globalização se daria mais recentemente, no século XIX, no final das guerras napoleónicas. Ainda nesse século, o liberalismo sobrepujou o mercantilismo e começou a ganhar espaço a democracia política. Mas essa nova onda globalizante sofreria uma abrupta interrupção com a Primeira Guerra Mundial (1914-1918).

A quarta e actual globalização passou a ocorrer logo após a Segunda Guerra Mundial e se acelerou bastante com o colapso do socialismo em 1989-1991.
Essa retomada da tendência à globalização é caracterizada pelo aparecimento de organizações internacionais (ONU, Gatt - substituído pela OMC, Bird etc), pela formação de blocos regionais, como o Mercado Comum Europeu (actual UE-União Europeia), pelo enorme surto de expansão das empresas multinacionais, pelo crescimento do comércio internacional e pela interligação dos mercados financeiros, possível graças à revolução da telemática.

Com o colapso do socialismo, reduziram-se as barreiras comerciais e aumentou o fluxo de investimentos para a Europa Oriental. A China começou a abrir-se comercialmente a partir de 1978, sendo, actualmente, o segundo país que mais absorve capitais estrangeiros, só perdendo para os EUA. Nota-se, cada vez mais, que a grande clivagem entre o capitalismo e o socialismo parece, em retrospecto, uma "guerra civil" dentro do Ocidente, uma vez que tanto o liberalismo quanto o marxismo são criações da cultura ocidental. O marxismo chinês e o de outros países asiáticos possuem características culturais próprias. Daí podermos dar razão a Samuel Huntingthon - diretor do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade de Harvard e autor de The Clash of Civilizations and the Remaking of World Order - quando diz que os futuros conflitos não serão mais entre sistemas socioeconómicos, mas entre civilizações.

"Após a Guerra Fria, a política mundial deixou de reger-se por posturas ideológicas; agora se realiza segundo pautas culturais. A maior fonte de conflitos internacionais não será o enfrentamento ideológico, mas o choque de civilizações."
HUNTINGTHON, S. Aceprensa (Pensamiento), Madrid, junho de 1997, p. 2

O actual processo globalizante tornou-se muito mais rápido, mais intensamente acelerado, com a revolução nas comunicações e mesmo com o maior avanço dos meios de transportes em geral. Também tornou-se mais abrangente, envolvendo não só comércio, produção e capitais, mas também serviços, arte, educação etc. Não sem razão, esse processo tem causado muito mais apreensão do que entusiasmo.

A globalização em sua fase actual teve uma contribuição importante dos japoneses com o conceito de "just in time", aplicado à produção, sobretudo industrial. Com o "just in time", começaram a surgir vários conceitos, como: reengenharia, "downsizing", terceirização e qualidade total.

A reengenharia, criação dos anos 90, trouxe alterações na actividade industrial que contribuíram para acelerar o processo de desemprego em massa nos países industriais e que vem atingindo também os países ditos emergentes.


A Importância da Educação

Com o advento da quarta globalização, que para muitos se confunde com uma nova era, a do conhecimento, a educação é tida como o maior recurso de que se dispõe para enfrentar essa nova estruturação do mundo.
Dela depende a continuidade do actual processo de desenvolvimento económico e social, também conhecido como era pós-industrial, em que notamos claramente um declínio do emprego industrial e a multiplicação das ocupações em serviços diferenciados: comunicação, saúde, turismo, lazer e informação.

O maior recurso - a educação
"Através da história e em virtualmente toda a parte da Terra, os homens viveram e multiplicaram-se, criando alguma forma de cultura. Sempre e em toda parte encontraram seus meios de subsistência e algo para poupar. Civilizações foram erguidas, floresceram e, na maioria dos casos, declinaram e pereceram. Este não é o lugar para examinar porque pereceram; podemos dizer, porém, que deve ter havido alguma falta de recursos. Na maioria dos casos, novas civilizações despontaram, no mesmo terreno, o que seria assaz incompreensível se apenas os recursos materiais tivessem falhado antes. Como teriam podido reconstituir-se tais recursos?
Toda a história - assim como toda a experiência actual - aponta para o facto de ser o homem, e não a natureza, quem proporciona o primeiro recurso: o factor-chave de todo o desenvolvimento económico brota da mente humana. Subitamente, ocorre um surto de ousadia, iniciativa, invenção, actividade construtiva, não em um campo apenas, mas em muitos campos simultaneamente. Talvez ninguém seja capaz de dizer de onde isso surgiu, em primeiro lugar, mas podemos ver como se conserva e até se fortalece: graças a vários tipos de escolas, por outras palavras, pela educação. Numa acepção bastante real, por conseguinte, podemos afirmar que a educação é o mais vital de todos os recursos."

SCHUMACHER, E.F. O negócio é ser pequeno. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1983, p. 67
Lester Thurow, ex-diretor do Instituto de Tecnologia de Massachussets e coordenador do Instituto Ásia-Pacífico, disse em São Paulo, em julho de 1997: "adaptado à nova ordem estará o país que, aberto à competitividade global, realize gigantescos investimentos em educação, já que a maior riqueza nacional passou a ser a mão-de-obra qualificada."


Tudo leva a crer que no século XXI, a principal actividade "industrial" será o turismo.
Com a redução das jornadas de trabalho na maior parte do mundo industrializado ou "ex-industrializado" e a idade avançada de seus habitantes, até pelo menos durante o período de reposição da população, o que as pessoas farão com o seu tempo disponível? Vão fazer mais viagens e irão em busca de mais entretenimento.
A arte também, nesse processo de mudanças, passará a ter um papel mais importante do que teve até agora, uma vez que o tipo de profissional exigido no século XXI será o homem "global".

Esse homem "global" terá por obrigação estudar durante toda a vida para se manter actualizado e membro da sociedade do conhecimento.

Aprendendo a aprender "Educação básica significa tradicionalmente, por exemplo, a capacidade de efectuar multiplicações ou algum conhecimento da história dos EUA.
Mas a sociedade do conhecimento necessita também do conhecimento de processos - algo que as escolas raramente tentaram ensinar. Na sociedade do conhecimento, as pessoas precisam aprender como aprender. Na verdade, na sociedade do conhecimento as matérias podem ser menos importantes que a capacidade dos estudantes para continuar aprendendo e que a sua motivação para fazê-lo. A sociedade pós-capitalista exige aprendizado vitalício. Para isso, precisamos de disciplina. Mas o aprendizado vitalício exige também que ele seja atraente, que traga em si uma satisfação." DRUCKER, P. Sociedade pós-capitalista. São Paulo, Pioneira, 1995, p.156

Quanto às mudanças na educação, além do novo enfoque exigido sobretudo em ciências sociais, do ponto de vista da pedagogia global, será preciso trabalhar mais com a informalidade, que por sua vez, só pode ser alcançada através da pedagogia da alegria e da positividade, cujos principais representantes são Georges Snyders (Alunos felizes) e Francisco Gomes de Matos (Pedagogia da positividade).

Um dos caminhos, dentre muitos, para a informalidade do ensino é o lúdico.

Por que o lúdico? Usando uma terminologia psicanalítica, o lúdico pode ser considerado um "material auxiliar expressivo", isto é, faz parte da terapêutica para a cura de muitos males do ensino. Desses males, o maior deles é o que nos lembram o grande poeta grego Píndaro (500 anos a.C.) e São Tomás de Aquino (século XIII): "o homem é um ser que esquece". Assim , ele precisa ser constantemente lembrado, principalmente do essencial, uma vez que o acidental o homem sempre traz na lembrança.

O homem é um ser que esquece "Se perguntássemos à milenar tradição do pensamento pelos fundamentos filosóficos da Educação, os antigos dar-nos-iam esta sentença - tão simples - para meditar: "O homem é um ser que esquece!"

No Ocidente, já entre os gregos (de Hesíodo a Aristóteles, de Safo a Platão), encontramos um extraordinário papel dado à memória (por vezes personificada em Mnemosyne), na educação.

(...)

O homem, ele que foi agraciado pela divindade com a chama do espírito, o homem (é o mito de Píndaro), afinal, saiu mal feito, mal acabado, ele tende ao embotamento, à insensibilidade... ao esquecimento!

É a partir dessa constatação - dessa trágica constatação de nossa condição ontológica (também ela, hoje, esquecida...) - que se edifica toda a educação ocidental.

As musas (filhas de Mnemosyne), as artes, são já uma primeira tentativa de Zeus para remediar essa situação: elas foram dadas pela divindade ao homem como companheiras, para ajudá-lo a lembrar-se... E é por essa mesma razão que os grandes pensadores da tradição ocidental consideravam as descobertas filosóficas, não tanto um deparar-se com algo novo ou insólito, mas, precisamente, descobertas: trazer à tona algo já visto, já sabido, mas que, por essa entrópica tendência para o esquecimento, não permanecera na consciência.

Assim, a missão profunda da educação não é de apresentar-nos o novo, mas algo já experimentado e sabido que, no entanto, permanecia inacessível: precisamente o que se expressa com a palavra lembrar.

LAUAND, Luiz Jean. Educação: Filosofia e História. São Paulo, Edix Edições, 1996, p. 39-41

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Um Comentário:


Este Blogue procura o espaço didáctico do conhecimento (numa perspectiva simples, pragmática e empírica), através do conhecimento académico e intelectual, em vista da procura de respostas para as “doenças culturais” da nossa sociedade e da época em que vivemos.
Apenas pretende ser um contributo, naturalmente.
E tudo em função de uma nova ordem política e económica do Estado e da Nação (em vigor, instalada e em exercício de facto), e que se tornou transversal e paralela a todos os Estados da Cultura Ocidental, em particular, no Espaço Europeu.

Presume-se, portanto, que o conhecimento generalizado da natureza dos “grandes fenómenos políticos e culturais” deste tempo e desta época trará (por si mesmo) uma parte das soluções necessárias para a sobrevivência pacífica da (nossa) humanidade.

Parece, por outro lado, ser ambicioso o propósito da “jornada”.
E é; de outra forma, não valeria a pena.

Porque o objectivo final, sendo concorrente a muitas peças deste tabuleiro geoestratégico e supra-disciplinar, é remunerador e “merece” todos os esforços empenhados para a sua culminação.

(ainda que muitas das “perguntas sem resposta” continuem nesse estádio, perenes nos nossos pensamentos)

A situação política e estratégica instável do mundo actual justifica todos os contributos empenhados, por mais insignificantes e incipientes que possam parecer a uma visão descuidada.


Em conformidade com estas premissas, explicado o conteúdo temático dos textos, retomemos o essencial do trabalho.


O texto transcrito neste artigo é um contributo importante para o entendimento dos fenómenos “Globalização” e “Educação no Século XXI”, na perspectiva da sua correlação e integração política, económica e social.

Os conceitos de globalização não são novos, mas o realce dado à “segunda globalização” no que respeita à sua identificação com a época dos “Descobrimentos” (tão querida aos portugueses pela origem da sua Pátria) é importante.
Portugal, com a epopeia dos “Descobrimentos do Novo Mundo” foi um precursor do fenómeno Globalização nos séculos XIV e XV.
Portanto, a origem da palavra está no nosso sangue e não deveria causar-nos tantos incómodos, embora seja um raciocínio ingénuo.

Quanto à natureza do “Ensino no Século XXI”, em fase de Globalização, o texto traduz um contributo importante para “esse” conhecimento necessário aos actores do nosso sistema.
(que seremos quase todos – pais, alunos e professores; políticos, agentes culturais, agentes económicos, académicos, intelectuais, auto-didactas, etc.)


Fica aqui mais um contributo.
(para algo ou alguma coisa deste nosso mundo)



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domingo, 11 de outubro de 2009

EDUCAÇÃO, DEMOCRACIA E GLOBALIZAÇÃO II

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De:
http://sisifo.fpce.ul.pt/?r=13&p=129


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Revista de Ciências da Educação Unidade de I&D de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa

Direcção de Rui Canário e Jorge Ramos do Ó





Educação e Globalização
Uma tentativa de colocar ordem no debate
Autor: Bernard Charlot


A palavra Globalização passou a ser muito utilizada nos discursos sobre educação, às vezes de forma positiva – “na época da globalização tem que fazer isso...” - muitas vezes de forma negativa.

No decorrer da História, o que se opunha à educação foi chamado de Diabo; nas décadas de 60 e 70, foi identificado como Reprodução; hoje em dia é simbolizado pela Globalização. Não estou dizendo que não devamos prestar atenção à globalização, muito menos que ela não traga problemas, mas que ao utilizar assim a palavra, misturam-se vários processos. Para se entender as relações entre Educação e Globalização, é preciso distinguir pelo menos quatro fenómenos, aqui enunciados e, a seguir, analisados.
Primeiro fenómeno: o fato de a educação ser pensada numa lógica económica, fato esse que aconteceu nas décadas de 60 e 70, na época do Estado Desenvolvimentista, antes da globalização.
Segundo fenómeno: as novas lógicas socioeconómicas, que se impuseram na década de 80. As décadas de 60 e 70 levaram a uma crise. Essa “crise”, que, na verdade, foi uma mudança estrutural do capitalismo mundial, induziu, por um lado, novas lógicas económicas e sociais e, por outro, uma aceleração da integração económica internacional, designada como globalização. As lógicas da qualidade, da eficácia, da territorialização apareceram na década de 80, que foi também a década em que se desenvolveu a globalização, mas não nasceram desta. Não são filhas da globalização, são irmãs ou primas.

É uma verdade que podem servir à globalização e ao neoliberalismo, mas podem também aprimorar um serviço público; de modo mais amplo, são lógicas de modernização.
Terceiro fenómeno: a própria globalização, integração entre as economias, e, portanto, entre as sociedades de vários países. Até agora, pouco incidiu sobre a educação, pelo menos em países como França ou Portugal; teve efeitos em países do sul, através do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial.
Entretanto, poderia provocar uma verdadeira revolução na escola, inclusive em países como França e Portugal, se fosse finalizado o projecto de liberalização dos serviços que está em andamento na Organização Mundial do Comércio (OMC), com o Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (AGCS).
Por fim, não se deve esquecer um quarto processo: o movimento que aceita a abertura mundial, sem por isso concordar com a lógica neoliberal da globalização. Poder-se-ia chamá-lo movimento para a solidarização da espécie humana. É um movimento desenvolvido pelos Fóruns Sociais Mundiais nascidos em Porto Alegre, inclusive o Fórum Mundial de Educação e, de outra forma, pelas Nações Unidas, com Educação Para Todos (EPT) e o programa do Milenário.
As datas dos processos podem variar. Ao dizer “isso aconteceu na década de 60, ou de 80”, está-se falando no tempo dos Estados Unidos, da Europa, do Japão, de países emergentes como Coreia do Sul, mas as datas podem ser outras em outros países. O que não varia é a existência de quatro fenómenos ou processos, que não devem ser confundidos, embora possam ser articulados em diversas formas.


As décadas de 60 e 70: a educação pensada numa lógica económica

A maior mudança da escola na época contemporânea já ocorre nas décadas de 60 e 70 e, portanto, é anterior à globalização. Consiste em pensar a escola na lógica económica e social do desenvolvimento.


Antes da Segunda Guerra Mundial, o Estado, na sua relação com a educação, permanece um Estado Educador: pensa a educação em termos de construção da nação, paz social, inculcação de valores. A partir dos anos 50 e, sobretudo, 60, ele se torna Estado Desenvolvimentista: claramente (França, Japão, Coreia do Sul, Brasil, etc.) ou de forma disfarçada (Estados Unidos), ele pilota o crescimento económico e coloca a educação a serviço do desenvolvimento. Essa política encontra um amplo consenso social, por gerar novos empregos qualificados, que uma escolaridade mais longa permite ocupar e, portanto, por satisfazer as classes médias e despertar esperanças nas classes populares.


Do ponto de vista escolar, a ambição é construir a escola fundamental, escola de nove anos que começa aos seis anos e vai até os quinze. Prolonga-se a escolaridade obrigatória, abre-se o primeiro segmento do que era o ensino secundário e acontece uma massificação da escola, com efeitos de reprodução social, mas também de democratização. Aparecem novos problemas materiais e financeiros, muito difíceis de ser superados nos países do sul, a tal ponto que, nos países pobres, ainda não foi atingido o objectivo da escola fundamental para todos.
Surgem também novos problemas pedagógicos ao passo que ingressam no fim da escola fundamental novos tipos de alunos. Mas tem-se de tomar cuidado no que tange a esse assunto. Espalhou-se a ideia de que se abriu a escola para o povo, sem que mudasse a escola. Na verdade, muitas coisas mudam na década de 70.

Transforma-se bastante a relação pedagógica: a forma como os alunos relacionam-se com os seus professores não tem nada a ver com o que acontecia na década de 50. Também os métodos de ensino e os livros didácticos mudam aos poucos. O que permanece igual é a chamada “forma escolar”, isto é, o tempo e o espaço da escola, o modo de distribuição dos alunos em séries/idades, os processos básicos do ato de ensino-aprendizagem.
Naquele momento da História em que a escola passa a ser percebida como elevador social, as questões do fracasso escolar, da desigualdade social face à escola e dentro da escola, da “igualdade de oportunidades” impõem-se, logicamente, como temas principais de debate sobre a escola. Não se fala da qualidade da escola, questiona-se a justiça da escola.
Também é nessa época que começa a se produzir o que, a meu ver, foi talvez o fenómeno mais importante: uma mudança da relação com o saber e a escola. Hoje em dia, para quê as crianças vão à escola? Para “passar de ano” e “ter um bom emprego mais tarde”. De certa forma, isso é realismo. Só que há cada vez mais alunos que vão à escola apenas para passar de ano e que nunca encontraram o saber como sentido, como actividade intelectual, como prazer. A ideia básica da teoria do capital humano, de que a educação é um capital que traz benefícios para a vida profissional, não é apenas uma ideia dos capitalistas, é também a ideia predominante na mente dos jornalistas, dos políticos, quer de esquerda, quer de direita, dos pais e dos próprios alunos. Assim cresce o descompasso entre o que a escola oferece e o que os alunos e os pais esperam dela e, portanto, aumentam as dificuldades dos docentes.
Já naquela época falavam, e ainda se fala hoje, de “crise da escola”.

Na verdade, se fosse uma crise, já faria tempo que a doente estaria morta! Trata-se de outra coisa: a escola contemporânea é permeada por contradições estruturais. Enquanto a escola selecciona os seus alunos, ela vive numa situação de relativa paz; quando ela se abre a novos públicos escolares, ingressam também nela novas contradições sociais. Cada vez que acontece uma democratização numa parte da escola, essa parte entra em “crise”. Por minha parte, prefiro essa “crise” de uma escola democratizada à paz de uma escola elitista.
Essa configuração socioescolar não foi um efeito da globalização; nasceu num momento de crescimento económico pilotado por um Estado nacional Desenvolvimentista, momento em que a educação e a escola também foram pensadas numa lógica de desenvolvimento. Na década de 80, esse Estado foi substituído pelo Estado Regulador, que remete também a lógicas económicas, mas outras que não as dos anos 60 e 70. Ingressou-se na época da Qualidade e da Globalização.


Da década de 80 para cá: novas lógicas económicas, sociais e educacionais

Já no final da década de 60 aparecem indícios de uma crise, a qual se torna ampla e evidente no final da década de 70. Ela leva a uma reestruturação do sistema capitalista internacional, chamada de globalização e, ainda, a novas lógicas socioeconómicas.
Quais essas novas lógicas? Em primeiro lugar, lógicas de qualidade, eficácia e diversificação.

Face à concorrência nos mercados internos e internacionais, é preciso produzir mercadorias e serviços cada vez mais atraentes pela sua qualidade e seu preço, usando máquinas e processos cada vez mais eficazes – e caros.

Em outras palavras, fazem-se necessários investimentos mais pesados e menos seguros, já que há o risco de que os concorrentes coloquem no mercado produtos ainda melhores e, assim, desvalorizem os investimentos feitos.

A crise é, antes de tudo, uma crise de rentabilidade do capital, que coloca o desafio da produtividade. Para proteger os seus mercados e conquistar novos e, ainda, para evitar gastar dinheiro à toa com produtos impossíveis de ser vendidos, a empresa deve prestar atenção à qualidade do que ela produz e à eficácia dos seus processos de produção. Para tornar os seus produtos mais atraentes, ela deve, ainda, levar em conta os gostos dos clientes, a diversidade da demanda e, portanto, juntar produção em massa, que proporciona economias de escala, e diversificação do produto, que aumenta as chances de este ser vendido. Esse problema pode ser resolvido graças às novas tecnologias.


Em segundo lugar, essas novas lógicas levam a um recuo do Estado.
Recua porque a concorrência entre empresas e a procura para mercados mais amplos induzem fenómenos de concentração económica e beneficiam multinacionais, que escapam ao poder dos estados nacionais.
Recua, ainda, porque as novas lógicas impõem formas de descentralização e territorialização. Com efeito, toma-se consciência de que a melhora da qualidade, da eficácia, da produtividade e, também, a conquista de novos mercados, requerem um engajamento “local”. Quem sabe dos múltiplos pequenos problemas a serem resolvidos para melhorar a eficácia dos processos de produção e a qualidade dos produtos é quem participa directamente da produção.

Quem sabe quais os gostos e exigências dos clientes é quem vende o produto. Portanto, a sede da empresa deve delegar aos escalões locais decisões atinentes aos actos de produção e comercialização, reservando para si as decisões estratégicas.
Ao passo que se impõem novas lógicas socioeconómicas e se reduz o engajamento directo do Estado nos assuntos económicos, diminuem as taxas de importação, abrem-se as fronteiras, estende-se a integração entre economias de vários países, integração essa que se realiza numa lógica neoliberal e que constitui a própria globalização.

Muitas vezes, consideram-se as novas lógicas como sendo neoliberais. Não há dúvida de que condizem com a ideologia neoliberal, na medida em que o destaque na eficácia fornece um argumento a favor da concorrência generalizada. No entanto, não se pode sustentar a ideia de que eficácia e qualidade sejam em si mesmas exigências neoliberais.
São também características de um serviço cujos usuários são bem atendidos, seja esse serviço comercial ou público. Quando se vai ver um médico, espera-se que ele seja eficaz e pratique uma medicina de qualidade; quando se leva a sua criança à escola, tem-se a expectativa de que ela receba um ensino de qualidade. Não se podem recusar as exigências de eficácia e qualidade, muito menos na sociedade moderna.

O problema a ser debatido é outro: o que se entende por “eficácia” e “qualidade” e quais os critérios para avaliá-las?
Além disso, ao estabelecer uma equivalência entre essas lógicas e o neoliberalismo, aceita-se a ideia de que não há eficácia e qualidade fora do neoliberalismo, o que, afinal de contas, contribui para impor a tese de que o neoliberalismo é a única forma possível para uma sociedade moderna. A meu ver, eficácia, qualidade, preocupação com a diversidade e com o contexto local remetem, antes de tudo, a lógicas de modernização, ainda que possam servir, e sirvam muitas vezes, ao neoliberalismo.
Essas lógicas, implantadas pelas empresas, são adoptadas pelo próprio Estado.
Este não desiste do seu objectivo, que continua sendo o desenvolvimento, mas ele renuncia à acção económica directa e se dedica à regulação das normas fundamentais e à manutenção dos equilíbrios sociais básicos: o Estado Regulador substitui o Estado Desenvolvimentista. Essa mudança do Estado não pode deixar de incidir sobre a escola, seja ela pública ou particular.
Em primeiro lugar, as novas lógicas requerem trabalhadores e consumidores mais formados e qualificados, quer para produzirem mercadorias ou serviços, quer para utilizá-los.
Não se trata apenas de desenvolver competências técnicas novas, mas também de aumentar o nível de formação básica da população: o auto-atendimento nos bancos e nas estações de metro, o uso da Internet, a compra de brinquedos electrónicos para os seus filhos, até a escolha do seu hambúrguer por combinação de várias opções ou a faxina de escritórios cheios de conexões eléctricas exigem modos de raciocínio outros que não os antigos.
Por consequência, faz-se necessário ampliar a escolaridade obrigatória da maioria da população até o fim do ensino médio. Aliás, pais e alunos visam esse nível e até o do ensino superior, para melhorar a posição do jovem no mercado de trabalho.
A escola, portanto, há de encarar um novo desafio. Apesar de não ter resolvido ainda os problemas atinentes à generalização do ensino fundamental, ela deve acolher jovens de classe popular no que era a parte mais elitista do sistema escolar: do ensino médio até o superior.
Em segundo lugar, a escola deve levar em conta as novas lógicas na sua própria organização.
Passa a ser interpelada sobre a sua qualidade e avaliada repetidamente. Deve elaborar projectos, celebrar contratos, firmar parcerias, colaborar cada vez mais com o meio local, etc. Essas lógicas novas atropelam o funcionamento tradicional da escola e a identidade dos seus professores. Poder-se-ia resumir o desafio novo a ser enfrentado pela escola e seus professores pelo seguinte constato.

Outrora, o professor era um funcionário público, cuja função era definida por textos oficiais. Bastava-lhe cumprir as exigências dos textos, em particular quando estava fiscalizado.
Se os pais reclamassem dele, podia invocar aqueles textos e concluir que estava cumprindo as suas obrigações e fazendo o seu trabalho. Acabou essa época. Hoje o professor é considerado um profissional.
O seu trabalho já não é, ou pelo menos não é apenas, cumprir tarefas predefinidas, é também, e antes de tudo, resolver os problemas. Pode inovar, pedir conselhos a quem quiser, mobilizar recursos locais, etc.: o que importa é que ele encontre um jeito para resolver os problemas na sua classe e entregue alunos bem sucedidos.

(...)

...”

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Um Comentário:

(breve e simples)

Parece que estamos a abandonar o estado de discussão política estéril e a tentar pôr ordem na questão, de facto.

E isso é responsabilidade directa de quem o deve fazer, que não políticos generalistas defensores acérrimos da causa pública e do povo português.

Quem o deve fazer são os homens e mulheres anónimos que trabalham todos os dias (e directamente) com o “problema”; necessariamente, técnicos e investigadores capazes para o seu ofício e com o espírito de iniciativa necessário e suficiente para tomarem a vanguarda (política) da causa e do serviço público ao Estado e ao povo português.

Porque é isso que é; antes, mesmo, do perfil especificamente técnico e científico das questões envolvidas.


Portanto, “estamos” a tentar dominar o “bicho”.
(horrível quanto dizem)


E vamos ser bem sucedidos, porque não resta outra hipótese para uma “causa das coisas” incontornável e com uma dinâmica assegurada para o nosso futuro global.


(...)


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(end of the item)

domingo, 4 de outubro de 2009

GLOBALIZAÇÃO E DEMOCRACIA II

http://fjjeparreira.blogspot.com





“...

Antes de procurar entender como os países se adaptaram ao processo de globalização, é necessário definir globalização. Não há consenso sobre um conceito fechado do que seja a globalização e sua origem. Pode-se analisar os factos que colaboraram para os seu desenvolvimento e discutir conceitos defendidos por alguns autores.

Há uma grande discussão que defende que a globalização teve seu início e começou a desenvolver-se de facto, com a empreitada europeia em direcção aos outros continentes. Outros defendem que começou ainda antes com a expansão do império romano por Alexandre, o Grande.

O Autor Thomas L. Friedman no livro “Os Lexos da Oliveira”, denomina a globalização como uma vertente da fragmentação da política, que teve seu auge a partir do ano de 1945, com o final da Segunda Guerra Mundial, até 1989, com a queda do muro de Berlim, o que simbolizou o insucesso do Socialismo. O processo de finalização da política bipolar ocorreu em função do final da Segunda Guerra Mundial, que teve seu desenvolvimento baseado em argumentos ideológicos onde havia apenas “um inimigo” a quem se opor. Dessa maneira, a política externa mundial era baseada em princípios e disputas estabelecidas pelos países líderes dos divergentes sistemas económicos vigentes naquele momento.

A popularização do termo globalização ocorreu em meados de 1980, e rapidamente passou a ser associado aos aspectos financeiros inerentes a esse processo. Dessa forma, o processo de globalização passou a ser considerado como uma constante no mundo moderno. Há que ressaltar que esse fenómeno não se restringe apenas às transacções comerciais e termos económicos, mesmo sendo esses aspectos os principais focos do processo de globalização. Porém, é facto que, além das relações económicas, esse processo envolve as demais áreas que integram as sociedades, como os âmbitos cultural, social e político.

A globalização é um fenómeno amplamente debatido, porém a compreensão das entradas que esse processo oferece às sociedades não pode ser definida, interpretada ou compreendida sem uma profunda reflexão, uma vez que, de acordo com David Held e Antony McGrew:
“Não existe uma definição única e universalmente aceite para a globalização. Como acontece com todos os conceitos nucleares das ciências, seu sentido exacto é contestável. A globalização tem sido (quando os altos dos agentes sociais de um lugar podem ter consequências significativas para “terceiros distantes”) como compreensão espaço temporal (numa referencia ao modo como a comunicação instantânea vem desgastando as limitações da distância e do tempo na organização e na interacção social); como interdependência acelerada entendida como a intensificação do entrelaçamento entre economias e sociedades nacionais, de tal modo que os acontecimentos de um país têm impacto directo em outros; como um mundo em processo de encolhimento (erosão das fronteiras e das barreiras geográficas na actividade socioeconómica); e, entre outros conceitos, como integração global, reordenação das relações de poder inter-regionais, consciência da situação global e intensificação da interligação inter-regional.”

A globalização caracteriza-se por um processo de integração global que induz ao crescimento da interdependência entre as nações, objectivando um claro entendimento quanto aos princípios desse processo, concordando com a perspectiva de David Held e Anthony McGrew; para uma clara compreensão o seguinte conceito de globalização será adoptado:
“É o conjunto de transformações na ordem política e económica mundial que vem acontecendo nas últimas décadas. O ponto de mudanças é a integração dos mercados numa “aldeia-global”, explorada pelas grandes corporações internacionais. Os Estados abandonam gradativamente as barreiras tarifárias para proteger sua produção da concorrência dos produtos estrangeiros e abrem-se ao comércio e ao capital internacional.

Esse processo tem sido acompanhado de uma intensa revolução nas tecnologias de informação — telefones, computadores e televisão. As fontes de informação também se uniformizam devido ao alcance mundial e à crescente popularização dos canais de televisão por assinatura e da lnternet. Isso faz com que os desdobramentos da globalização ultrapassem os limites da economia e comecem a provocar uma certa homogeneização cultural entre os países.”


Uma das nítidas consequências do processo de globalização foi o impulso dado a uma transformação nos padrões de interligação mundial, dessa maneira: “O conceito de globalização denota muito mais do que a ampliação de relações e actividades sociais atravessando regiões e fronteiras. E que ele sugere uma magnitude ou intensidade crescente de fluxos globais, de tal monta que Estados e sociedades ficam cada vez mais enredados em sistemas mundiais e redes de interacção. Em consequência disso, ocorrências e fenómenos distantes podem passar a ter sérios impactos internos, enquanto os acontecimentos locais podem gerar repercussões globais de peso. Em outras palavras, a globalização representa uma mudança significativa no alcance espacial da acção e da organização social, que passa para uma escala inter-regional ou intercontinental.”

Esse fenómeno proporciona maior visibilidade à política interna dos países em um cenário global, com maior velocidade na interacção social, passando os acontecimentos a ter um impacto não apenas local, mas mundial em um efeito imediato. De acordo com Nestor Garcia Canclini “a globalização denota a escala crescente, a magnitude progressiva, a aceleração e o aprofundamento do impacto dos fluxos e padrões inter-regionais de interacção social.”

A partir disso, todas as esferas da sociedade passam a sofrer influencias oriundas desse processo, integrando aspectos que não possuía na sua génese.

...”

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Um Comentário:

O texto de referência é expressivo e sintomático do fenómeno universal denominado “Globalização”.

E como importa, culturalmente falando, conhecer o mais profundamente possível esta dinâmica transversal da nossa vida diária da actualidade, acho por bem num blogue temático desenvolver (exaustivamente) este tema.

A Globalização nasceu no pós-2ª Guerra Mundial como consequência directa (provável) da aplicação do “Plano Marshall” aos países do continente europeu. Aquele plano teve como mentor os EUA e a sua aplicação foi da responsabilidade do seu presidente Franklin Roosevelt.
[“ O Plano Marshall, um aprofundamento da Doutrina Truman, conhecido oficialmente como Programa de Recuperação Europeia, foi o principal plano dos Estados Unidos para a reconstrução dos países aliados da Europa nos anos seguintes à Segunda Guerra Mundial. A iniciativa recebeu o nome do Secretário de Estado dos Estados Unidos, George Marshall ”].

E é curioso salientar que Portugal recusou a aplicação daquele plano à sua economia e ao desenvolvimento estrutural do país.

Portanto, a globalização terá nascido na Europa e como resultado directo do crescimento industrial, económico e estrutural dos países envolvidos na 2ª G.M., mas estendeu-se a todos os países do mundo, em particular, aos EUA que são o grande impulsionador da economia mundial.


Na ressaca de todos os acontecimentos económicos inerentes ao fenómeno político Globalização nasceu e cresceu a sua antítese política, ou seja, a Anti-Globalização.

Este movimento político generalizado a quase todos os países do mundo caracteriza-se por diferentes tipos de acontecimentos, quase todos de grande profundidade e alcance político, económico e social; e têm, normalmente, um perfil associado a manifestações de violência sob as mais diversas formas (coacção física e psicológica violenta, demonstrações de força e aplicação da violência física directa sobre os representantes que simbolizam o Regime e o Poder do Estado).

Em Portugal, podem identificar-se diferentes manifestações de existência e actividade operacional relacionada com o fenómeno político denominado “Anti-Globalização” desde 1950; e como consequência do despoletamento daquele processo nos países mais poderosos e/ou desenvolvidos da Europa.

A Globalização, em Portugal, terá tido início no período pós-monarquia e na sequência do Golpe de Estado que pôs fim à 1ª República e criou o “Estado Novo”.

É óbvio que aquele processo político e económico estrutural do país teve especial amplitude de aplicação e crescimento no pós-Abril de 1974, e depois de volvidos os anos de convulsão política que duraram (na prática) até à adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia (actual União Europeia).

(...)


Muito fica por dizer em próximas páginas deste blogue.
(e outros espaços cibernautas)



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